México Urgente

A tarde estava quente como tarde de verão. Apesar do vento seco que levantava a poeira nas ruas do centro da cidade, o clima era ameno entre as pessoas que formavam grupinhos para conversar, na esquina da Alfândega com a Primeiro de Março, enquanto aguardavam a última notícia do palestrante que estava quase quarenta minutos atrasado e, àquela altura, já teria chegado ao aeroporto Santos Dumont.
Do lado de dentro do prédio, no auditório da Escola de Cinema Darcy Ribeiro, filmes de alunos eram projetados para uma platéia formada pelos poucos que resolveram esperar sentados pela chegada do escritor e roteirista Guillermo Arriaga. Entre eles, alunos e ex-alunos, cineastas, produtores, atores e atrizes.
Zanzando de um lado para o outro – empunhando o celular, e atenta para o movimento na entrada do lobby – só Irene Ferraz, a diretora da escola e responsável pelo evento; indispensável, em sua opinião, para a formação dos alunos de cinema. Porque Irene é assim, mais beneditina do que jesuíta, investe mais na formação do que na excelência. E por conta disso, está sempre empenhada em trazer para a escola tudo o que contribua para dilatar a sensibilidade dos alunos e estimular seu potencial artístico.
O roteirista de “21 gramas” chegou com uma hora de atraso, acompanhado pelo colega Marçal Aquino, mediador do debate. Depois das desculpas devidas e aceitas, o brasileiro fez a apresentação do colega mexicano e contou que Arriaga estava no Brasil para divulgar seu novo livro, O Esquadrão Guilhotina, editado pela Gryphus, a mesma de seus outros dois romances, O Búfalo da Noite e Um Doce Aroma de Morte.
Na conversa que se seguiu, o tema principal foi o novo trabalho de Arriaga como diretor de cinema (“The Burning Plain”, com Charlize Theron e Kim Basinger). Isso ensejou o papo sobre a relação, em Hollywood, entre diretores e produtores. Esses últimos, segundo Arriaga, sempre presentes em duas ocasiões: “a de ajudar o diretor a fazer um filme melhor e a de não deixar o diretor fazer uma besteira.”
Quanto à diferença entre o trabalho solitário do roteirista e a atividade no set de filmagem, ele disse que não há nada mais divertido do que dirigir um filme “com uma grande equipe, mais de 150 pessoas, e muitas mulheres bonitas”.
Quando perguntado até que ponto um diretor autoral é respeitado pela indústria cinematográfica norte-americana, o roteirista de “ Os Três Enterros de Melquiades” foi taxativo:
_ Tudo em Hollywood depende de como você se vende. Se você se vender como diretor autor, vão te comprar como tal e respeitar seu trabalho autoral.
Nessa altura, eu perguntei a Arriaga se era verdade que seu roteiro de “Amores Brutos” havia sido reescrito 27 vezes antes de ser filmado. Ele não só confirmou a informação como disse que costuma reescrever até 50 vezes uma página de roteiro, e confidenciou ao público ali presente que a primeira página do seu primeiro romance foi reescrita OITOCENTAS vezes.
Exagero ou não, o fato é que essa declaração valorizou ainda mais, em minha opinião, a pessoa e a literatura de Gullermo Arriaga; por ele declarar, dessa forma, que não se considera um “gênio da raça”, mas um dedicado operário da arte de escrever.
Ao fim do debate, bem impressionada, levei ao escritor meu exemplar de seu novo romance para ser autografado. Quando me vi frente a frente com o roteirista de “Babel”, contei-lhe da viagem maravilhosa que fiz à Cidade do México no ano passado e conversamos um pouco sobre as diferenças e semelhanças entre nossos dois países. Poucos minutos depois, despedi-me de Guillermo Arriaga ainda mais bem impressionada. Nem tanto pelo dedo de prosa agradável que ele me dedicara, quanto pela beleza singular de seus grandes olhos azuis.

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