Sorry Salvador...

Sorry Salvador, mas o carnaval no Rio é que foi massa. A cidade recebeu mais de um milhão de turistas, a taxa de ocupação dos hotéis chegou a 95%, e não só na orla, mas no Centro, Flamengo, Catete e Botafogo. A ideia da prefeitura de espalhar os blocos pela cidade deu muito certo, pois se houve aumento do número de foliões, o trânsito ficou mais desafogado com a maior concentração da folia na região central. O lixo ainda é um problema, mas a prefeitura informa que houve considerável melhora em relação a 2011, já que muitos blocos foram seguidos por catadores de latinhas que vivem da reciclagem.

Melhor que isso, só se resolverem o problema do xixi. Este ano, mais de mil pessoas foram detidas mijando na rua e calcula-se que o número de mal educados seja, é claro, bem maior. Aproveitando a deixa, vai aí uma sugestão: deter também os donos dos cachorros que mijam o ano todo nas ruas do Rio. E muitos desses cães são grandes o suficiente para emporcalhar a cidade tanto quanto adultos de porte médio. E ainda investir em campanhas que constrangessem donos de animais a pelo menos limpar a merda de seus estimados porcalhões, pois estes são exceções. De qualquer forma, com saquinho de plástico ou não, eu acho um horror uma pessoa levar um animal para cagar e mijar na rua. Ora, se um cidadão não se adapta às regras da cidade, que vá morar no mato.

Mas voltando ao carnaval, foi mesmo o melhor dos últimos tempos. Não que eu tenha brincado em algum bloco, apenas fiquei no Rio e fiz os programas que mais gosto e que são caminhar na praia, mergulhar no mar e ir ao cinema. Este ano, a graça era ver o máximo de filmes concorrentes ao Oscar e depois acompanhar a entrega do prêmio. Valeu. As praias estavam limpinhas logo cedo, o mar tinha ótima aparência e a água estava bem gelada como gosta o carioca.

Como eu prefiro as sessões noturnas, passei por vários blocos no trajeto para os cinemas, e pude apreciar tanto concentrações quanto dispersões. Foi impressionante o número de gente fantasiada, principalmente os rapazes, que aderiram de vez às perucas engraçadas. A alegria reinava em Copacabana e Ipanema. A rua Visconde de Pirajá era uma festa só em quase toda a extensão, sem violência e com muito humor. Aliás, a sensação de segurança foi notória no período momesco. Atestada por quem, na falta de taxi, voltou algumas vezes pra casa de ônibus, e depois da meia noite.

Por tudo isso, a prefeitura, o carioca e os turistas estão de parabéns. Já os filmes concorrentes e a festa do Oscar eu deixo para comentar na próxima postagem, por que esta já está de bom tamanho e o assunto cinema merece um espaço maior. Um abraço e até lá.

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Do frevo ao manguebeat

Meu primeiro carnaval inesquecível foi em Recife, na casa de meus tios, junto com cinco primas adolescentes. Ainda havia corso naquela época, uma tradição portuguesa com certeza que nos levava todas as tardes, durante os quatro dias de folia, à linda Avenida Guararapes em jipes sem capota alugados, como fazia toda a sociedade local.

Ressalto o caráter português da brincadeira que misturava azaração com certa brutalidade que em muito lembra uma passagem de O Cortiço, de Aluísio de Azevedo, na qual ao se conhecerem no navio, vindo de Portugal para o Brasil, Jerônimo e Piedade começam o namoro de pisões e beliscões que os levaria ao altar.

Pois assim era o corso em Recife. Quando um rapaz estava interessado numa garota, vinha em sua direção e empapuçava-a toda com punhados de farinha de trigo, aproveitando a oportunidade para esfregar-lhe os braços e assanhar-lhe os cabelos. E as meninas por sua vez mostravam suas preferências esguichando contra eles jatos de bisnagas cheias de água e óleo de cozinha. Uma porcaria só, mas gostosa como o quê.

E assim se preparava o clima para os bailes da noite, depois de horas e horas de banho, até que se conseguisse limpar toda a gororoba. Lindas, então, íamos dançar e continuar a paquera nas festas do Country Club, do Náutico, e do Internacional. Ali, o frevo corria solto e eu, carioca de primeira viagem, ficava fascinada vendo os homens de smoking e as mulheres de longos ou fantasias de luxo, tanto jovens como velhos, afluírem ao salão em passos frenéticos ao som contagiante dos naipes de sopro tocando Capiba.

Tais lembranças me ocorreram com vivacidade não apenas por estarmos já em clima de carnaval, mas principalmente por conta do livro Do frevo ao manguebeat, que acabo de ler. Nele, o jornalista e crítico musical José Teles faz um passeio pela história da música pernambucana, passando pelos gêneros historicamente reconhecidos, como o frevo e o forró, pelo erudito e instrumental, até a música urbana contemporânea que, na versão de Chico Science e Nação Zumbi, estourou na Europa e Estados Unidos, influenciando todo o pop brasileiro dos anos 90.

Paraibano de Campina Grande, José Teles cresceu no Recife onde escreve para o Jornal do Commercio desde os anos 80. Com cerca de 20 livros publicados, é autor da biografia do Quinteto Violado, lançada agora em comemoração aos 40 anos do grupo, numa exposição no Centro Cultural dos Correios.

Fã da qualidade e diversidade da música pernambucana, que considero das mais criativas e instigantes do mundo, aproveitei a chance e fui entrevistar Marcelo Melo, remanescente da formação original do Quinteto Violado. De quebra, assisti ao espetáculo do grupo que desfila frevos, forrós e baiões numa concepção musical de interação entre o erudito e o popular que faz a gente sair do chão, de corpo e alma.

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O Rio de Janeiro e suas bicicletas voadoras

A economia do Brasil está bombando e isso se reflete diretamente no turismo do Rio de Janeiro. Na Zona Sul, principalmente, mas também no Centro e na Lapa o que mais se vê são visitantes de outros estados brasileiros. O pessoal do Centro Oeste é o mais frequente e disputa lugar nos restaurantes e bares da orla com os estrangeiros, que continuam vindo para cá aos montes e cada vez mais em grupos de jovens. Quem se aventurar a dar uma volta em Copacabana, num final de tarde qualquer, poderá conferir que o turismo no Rio já não é apenas sexual, e isso há algum tempo.


Na verdade, o Rio de Janeiro está se firmando como point internacional para todo tipo de gosto, gênero e idade. Porém, para o carioca, a coisa não está tão boa assim. A começar pelos preços inflados dos serviços e moradia. Hoje, um jovem casal carioca que se casa e quer constituir família vai ter que mudar de vida mesmo. Mas para pior, porque os preços dos imóveis para compra e aluguel, no mínimo, triplicaram em menos de 5 anos. Tudo bem se os salários aqui tivessem acompanhado a euforia do mercado imobiliário. Não é o caso. Pegue uma empresa nacional e compare o contracheque de um gerente do Rio com um de São Paulo. De banco às teles, a discrepância é abissal.


Para os mais velhos, a vida no Rio também não melhorou. Acho até que está bem pior, apesar da pacificação das favelas. É inquestionável que a cidade está mais segura do ponto de vista da macroviolência, viu-se livre da barbárie do tráfico e etc. E isso contribuiu efetivamente para fomentar a euforia social e econômica em que o Rio vive hoje, aditivada ainda pelas expectativas em torno da Copa do Mundo e Olimpíadas.

Mas é do dia a dia que estou falando, do transito dos pedestres pelas calçadas, em seus próprios bairros e adjacências. E aí a coisa pega, e compromete a qualidade de vida do morador do Rio. Pois veja, numa singela ida ao supermercado um idoso morador de Copacabana corre o risco de ser atropelado, já que a avenida que corta o bairro virou corredor exclusivo de ônibus, o BRS. Está certo que o coletivo tenha prioridade, pois foi justamente a falta de transporte público rápido, barato e seguro no Rio de Janeiro a grande responsável pelo crescimento desordenado da cidade e seus perniciosos efeitos colaterais. O que falta é levar em conta a condição do pedestre de um bairro que tem, em sua maioria, moradores da terceira idade. No BRS da Av. N. S. de Copacabana, muitos sinais fazem contagem regressiva de 10 segundos no vermelho, uma verdadeira gincana para os idosos que frequentemente são vítimas de atropelamentos com um número assustador de óbitos.


Nas calçadas há perigo também. E se antes eram os entregadores do comércio com suas bicicletas e triciclos voadores a trafegar pela contramão e cortar caminho pelas calçadas levando pânico aos mais velhos, a eles se juntaram, nos últimos tempos, os ciclistas de todas as categorias, motorizados ou não, jovens ou maduros, a trabalho ou a passeio. Eu mesma seria forte candidata à vítima desses maníacos, não fosse o cuidado que tenho atualmente ao andar também pelas calçadas . E aí, ainda temos que sofrer com a merda dos cachorros, já que para cada dez donos de au-au apenas um leva o saquinho sanitário.


Bem, eu sou carioca da zona sul, adoro praia, caminhar na orla, ir a cinema de rua, tomar cafezinho no botequim e suco de fruta na lanchonete. E é por amar caminhar nas ruas do meu bairro que chamo a atenção para esses detalhes que fazem a qualidade de vida do morador.


Torço pelo Rio de Janeiro, Cidade Maravilhosa de fato, que está sim cada vez melhor. Mas nem por isso acredito que devemos nos acomodar e deixar de apontar defeitos e reivindicar iniciativas de quem por direito e dever administra o estado e a capital. É também direito e dever de todo cidadão apontar desmandos para ajudar a garantir uma satisfatória qualidade de vida para todos os moradores de sua cidade.

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