O Rio de Janeiro e suas bicicletas voadoras

A economia do Brasil está bombando e isso se reflete diretamente no turismo do Rio de Janeiro. Na Zona Sul, principalmente, mas também no Centro e na Lapa o que mais se vê são visitantes de outros estados brasileiros. O pessoal do Centro Oeste é o mais frequente e disputa lugar nos restaurantes e bares da orla com os estrangeiros, que continuam vindo para cá aos montes e cada vez mais em grupos de jovens. Quem se aventurar a dar uma volta em Copacabana, num final de tarde qualquer, poderá conferir que o turismo no Rio já não é apenas sexual, e isso há algum tempo.


Na verdade, o Rio de Janeiro está se firmando como point internacional para todo tipo de gosto, gênero e idade. Porém, para o carioca, a coisa não está tão boa assim. A começar pelos preços inflados dos serviços e moradia. Hoje, um jovem casal carioca que se casa e quer constituir família vai ter que mudar de vida mesmo. Mas para pior, porque os preços dos imóveis para compra e aluguel, no mínimo, triplicaram em menos de 5 anos. Tudo bem se os salários aqui tivessem acompanhado a euforia do mercado imobiliário. Não é o caso. Pegue uma empresa nacional e compare o contracheque de um gerente do Rio com um de São Paulo. De banco às teles, a discrepância é abissal.


Para os mais velhos, a vida no Rio também não melhorou. Acho até que está bem pior, apesar da pacificação das favelas. É inquestionável que a cidade está mais segura do ponto de vista da macroviolência, viu-se livre da barbárie do tráfico e etc. E isso contribuiu efetivamente para fomentar a euforia social e econômica em que o Rio vive hoje, aditivada ainda pelas expectativas em torno da Copa do Mundo e Olimpíadas.

Mas é do dia a dia que estou falando, do transito dos pedestres pelas calçadas, em seus próprios bairros e adjacências. E aí a coisa pega, e compromete a qualidade de vida do morador do Rio. Pois veja, numa singela ida ao supermercado um idoso morador de Copacabana corre o risco de ser atropelado, já que a avenida que corta o bairro virou corredor exclusivo de ônibus, o BRS. Está certo que o coletivo tenha prioridade, pois foi justamente a falta de transporte público rápido, barato e seguro no Rio de Janeiro a grande responsável pelo crescimento desordenado da cidade e seus perniciosos efeitos colaterais. O que falta é levar em conta a condição do pedestre de um bairro que tem, em sua maioria, moradores da terceira idade. No BRS da Av. N. S. de Copacabana, muitos sinais fazem contagem regressiva de 10 segundos no vermelho, uma verdadeira gincana para os idosos que frequentemente são vítimas de atropelamentos com um número assustador de óbitos.


Nas calçadas há perigo também. E se antes eram os entregadores do comércio com suas bicicletas e triciclos voadores a trafegar pela contramão e cortar caminho pelas calçadas levando pânico aos mais velhos, a eles se juntaram, nos últimos tempos, os ciclistas de todas as categorias, motorizados ou não, jovens ou maduros, a trabalho ou a passeio. Eu mesma seria forte candidata à vítima desses maníacos, não fosse o cuidado que tenho atualmente ao andar também pelas calçadas . E aí, ainda temos que sofrer com a merda dos cachorros, já que para cada dez donos de au-au apenas um leva o saquinho sanitário.


Bem, eu sou carioca da zona sul, adoro praia, caminhar na orla, ir a cinema de rua, tomar cafezinho no botequim e suco de fruta na lanchonete. E é por amar caminhar nas ruas do meu bairro que chamo a atenção para esses detalhes que fazem a qualidade de vida do morador.


Torço pelo Rio de Janeiro, Cidade Maravilhosa de fato, que está sim cada vez melhor. Mas nem por isso acredito que devemos nos acomodar e deixar de apontar defeitos e reivindicar iniciativas de quem por direito e dever administra o estado e a capital. É também direito e dever de todo cidadão apontar desmandos para ajudar a garantir uma satisfatória qualidade de vida para todos os moradores de sua cidade.

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Um comentário:

dil disse...

Concordo, Leila.

Acho muito equilibrada sua crítica. De fato, o Rio passou por mudanças significativas que deixaram os cariocas bem entusiasmados, eu diria até com um certo, digamos, excesso de auto estima (rs..). Mas não podemos deixar que essa euforia toda ( Copa, Olimpíadas, etc.) maquie os problemas graves, alguns novos outros históricos que nos assolam.

Acho que o prefeito atual, cuja administração é, sem dúvida, melhor que o desastre da anterior, fez uma opção muito clara pela cidade–empresa. É um Rio pra gringo ver , pra ficar bem na foto, de mãos dadas com bancos e empreiteiras e de costas para as demandas reais da população.

Acho que o Rio sofre um processo de despolitização que não condiz com sua história de participação e decisão inclusive nas causas nacionais. A euforia tomou conta, e ‘neguinho’ não tá se dando conta...os preços de tudo estão absurdamente abusivos; as vezes desço pra ir ao mercado e me sinto como aquele morador nativo de Búzios, que paga o mesmo preço do turista – os aluguéis então nem se fala..Até a diversão mais simples do carioca, o chopinho nosso de cada dia.rs.

Uma outra coisa que infelizmente eu tenho reparado é na falta de educação crescente das pessoas, na falta de gentileza só pra ficar num exemplo mais trivial. A alegria persiste, ela é marca registrada da nossa gente, mas noto uma certa inquietação nas pessoas, uma pressa...Apesar dos mil eventos e dos holofotes pra tudo quanto é lado percebo as pessoas, paradoxalmente, mais afastadas mais ensimesmadas, sei lá, é uma sensação minha..Acho que isso tudo tem a ver com a questão política tb, com o tipo de cidade que está sendo pensada nesses últimos anos.

Mas continua lindo, a isso continua..

Abraços

Adilson