PLÍNIO MARCOS na TV

Quando eu trabalhava em televisão, não via televisão. Na verdade, quase não via, porque assistir ao Jornal Nacional é norma nas redações de telejornalismo e assistir a um telejornal do turno contrário ao que se trabalha é obrigatório para os jornalistas. Assim, eu fazia o meu e assistia a mais dois programas de televisão por dia, e só. Nem aos domingos eu ligava a televisão, pois era ouvir as vinhetas dos programas mais populares para sentir uma angústia tremenda. Chamam a isso de angústia de domingo, e só quem sofre ou já sofreu desse mal pode entender.
Agora, sem trabalhar na tv e curada da angústia de domingo, resolvi recuperar os programas perdidos. Na primeira garimpagem, encontrei o DVD da entrevista de Plínio Marcos para o Roda Viva, da Cultura. É um colosso de bom! De saída, Plínio Marcos envereda pelo caminho da verdade com bravura. Diz que depois de ter sido o dramaturgo brasileiro mais perseguido pela ditadura militar, passou a ser censurado pela mídia quando veio a anistia. Diz que os jornais só noticiam as peças que pagam anúncios em suas páginas e que qualquer atriz bonitinha de novela tem mais destaque quando estréia do que qualquer espetáculo reconhecidamente bom pelos próprios críticos dos jornais. E por aí ele vai, descascando a imprensa, desancando a política partidária, descompondo a televisão brasileira e servindo ao espectador o mais saboroso banquete de sinceridade, humanidade, honestidade, autenticidade, inteligência e sabedoria, tudo regado a muito humor.
No programa, de 1988, o autor de Dois Perdidos Numa Noite Suja, Navalha na Carne e Barrela exalta o trabalho dos atores, incentiva a impetuosidade dos jovens, faz um libelo da liberdade de expressão, “sem a qual não haverá preservação dos direitos humanos”, e ainda diz que prefere morrer na sarjeta a fazer comercial, pois não admite a perversão de “pegar pessoas que não podem comprar e insistir para que elas comprem”. Tudo dito assim, de forma muito simples, do jeito que faz a gente gostar de ver e ouvir gente falar. Portanto, acredite, o Plínio Marcos no Roda Viva é programa para enfrentar qualquer angústia de domingo

Cruz X Credo

A campanha para eleger o Cristo Redentor uma das Sete Maravilhas do Mundo tem na geração de milhares de empregos indiretos no turismo um apelo irresistível para o morador de uma cidade com a economia acachapada, como o Rio de Janeiro. Fora a injeção de auto-estima, sempre bem vinda, segundo a crença vulgar e o lugar comum das mesas de bar. E agora, que as operadoras de celular abriram mão do valor cobrado pelas mensagens de voto, virou obrigatório se engajar “nessa luta”.
Mas que luta é essa, bicho? Alguém acredita que ganhar um concurso promovido por uma ONG da Suíça é mais importante para o desenvolvimento do turismo no Brasil do que resolver o problema do apagão aéreo. Ou dá pra perceber que tudo não passa de mais um número deste grande circo eternamente montado para distrair corações e anestesiar mentes. Olha o Pam aí jogando mazelas para debaixo do tapete enquanto enche de dinheiro as burras dos poderosos da ocasião. Mas isso é a história da cartolagem no país... E se no Brasil é assim, no Rio de Janeiro, é assim e meio.
Pois não é que um dia, sem protesto das outras religiões, a igreja católica se apropriou de uma das montanhas mais bonitas do mundo e tascou-lhe no topo esse penduricalho cafona que é a estátua do Cristo Redentor. Um monumento ao kitsch, isso sim. Uma interferência desnecessária ao conjunto de montanhas que formam o extremamente belo relevo da cidade. Ainda mais escabrosa me parece essa idéia quando vejo o Corcovado virgem, numa litografia do séc. XIX, como a Vista da Montanha do Corcovado e do bairro do Catete, de Rugendas. Ou numa das muitas fotografias de paisagens do Rio de Janeiro de Marc Ferrez, como a Vista de fora da Baía de Guanabara, do lado de Niterói, de 1890.
É como diz meu namorado: Não dava para suportar o Bom?

Aqui e na Dinamarca

Descobri o myspace, uma boa da internet. Boa para mim, para você e pra todo mundo. Já sei que funciona como o orkut, mas eu não saco nada de orkut, nunca quis ter um e nunca me bateu a curiosidade de ir lá fuçar. No entanto, assim que recebi o e-mail do Eduardo Feijó contando que acabou de fazer um cd do qual era possível conhecer algumas músicas no myspace.com/eduardofeijo, eu acessei o endereço.
O Dudu foi meu colega de faculdade nos anos 80 e, apesar da gente quase nunca se encontrar, há entre nós um carinho igual ao daquele tempo. Eu sei que essas coisas legais acontecem com todo mundo. E é exatamente por isso que disse que o myspace é bom pra todo mundo, porque, ao contrário do orkut, ele pegou nos quatro cantos do planeta e não apenas no Brasil. Então, a minha melhor amiga, por exemplo, pode ouvir as músicas do novo trabalho do Vadu (myspace.com/vadu), ex-namorado dela que é cantor e compositor em Cabo Verde. Portanto, se você tem um amigo baterista na Dinamarca, dá uma pescada na rede pra ver como anda a batida dele.
Eu já entrei no myspace pra dar uma geral, e me programei para curtir o som do Eduardo Feijó no próximo domingo de manhã (meu horário relax de música, reservado inclusive para os novos cds). Agora, diferentemente da minha melhor amiga e de você que tem um amigo baterista na Dinamarca, eu vou poder ver pessoalmente o Dudu na próxima quinta-feira, num chopinho combinado com o pessoal da UFRJ. E vou conferir se a foto do myspace é daquelas antigas, ou se ele continua o mesmo gatinho da época da faculdade.

A Luz de Santa Teresa

Os jornais chegaram no fim de semana com inúmeras sugestões de programa para o dia dos namorados. Como foi difícil escolher apenas um, assim, na lata, resolvemos fazer reservas em quatro restaurantes para decidir no dia em qual iríamos jantar. O critério de seleção foi a pedida mais interessante, alguma coisa fora do lugar comum. Queríamos um programa que desse certo, é claro. Mas que não fosse careta demais. Já chega ter que enfrentar o dia dos namorados com a obrigatoriedade de comemorar, achar presente, escrever cartão, ficar bonita (o) para o outro e ainda acertar na programação. É um misto de angústia e ansiedade pra namorado nenhum botar defeito.
Chegou o dia de ontem e nos decidimos pelo Espírito Santa, por vários motivos. Dentre eles, porque sou de Santa Teresa. Não moro mais lá, porém, não paro de gostar daquele bairro. Assim que estacionamos o carro (com facilidade) no Largo dos Guimarães, fomos dar uma voltinha a pé para fazer hora. Fomos ao armazém da D. Lurdes cumprimentá-la. Que saudades! Abraços, beijos e lágrimas portuguesas com certeza.
Voltamos curtindo o silêncio, o bonde, os casais entrelaçados, o cheiro fresco da noite e a luz de Santa Teresa. Ah, a luz de Santa... sempre luz de domingo, faça chuva ou faça sol, faça frio ou calor, de noite e de dia também.
Mas o melhor foi o jantar. Eu não conhecia o restaurante, mas sabia que teria uma varanda reservada para nós. E o anúncio prometia cobertores se o frio apertasse. Quer coisa melhor? Pois teve um menu degustação do dia dos namorados como só um restaurante em Santa Teresa pode oferecer. Pra começar, um belo drinque de vodca com as frutas mais exóticas do Brasil. Uma entrada de frutos do mar com ostra e tudo o mais e duas escolhas gostosas de prato principal. A sobremesa era digna da mais pura larica. E de saideira, numa cuia cheia de gelo, para dois, um drinque chamado Viagra da Região: ... catuaba, guaraná em pó, ginseng, suco de cupuaçu, água de coco, cachaça e “nó de cachorro”. Meu Deus, o que pode ser “nó de cachorro”?, seria um foguete, uma bala de revolver, um disco voador, um super vegetal? Saímos de lá sem saber. Vai que a gente pergunta e o garçom responde que nó de cachorro é nó de cachorro mesmo.

Os Seios de Deus

Fui convidada para fazer uma participação no novo filme de Alberto Salvá, baseado no romance de Rodrigo Abi Ramia, que fala do caso de amor entre dois jovens, Rodrigo e Mariana. Eu seria a mãe da moça que só aparece na cena em que fala com o genro ao telefone enquanto a própria filha protagoniza uma cena de felação com o rapaz que goza falando com a mãe da moça do outro lado da linha. Resolvi não aceitar o papel. É coisa para profissional, acredito.

No entanto, gostei do Roteiro. Não que haja novidade na sinopse: um rapaz conhece uma garota na faculdade, os dois se apaixonam e passam a viver uma história de amor.
Acontece que Rodrigo, o protagonista, embarca numa aventura sexual desmesurada em busca de total intimidade com a namorada. Ele quer mais que o corpo, coração e mente de Mariana. Ele a quer por dentro, por fora e pelo avesso também. Ele a quer com todos os sentidos e vai ao paroxismo do prazer tátil com os excrementos da mulher amada.

O tema também não é original, eu sei. Já vimos esse filme antes... um homem embarca na perigosa expedição ao universo do amor obsessivo. Mas aí era um Bertolucci, ou ainda um Polanski. E mais, os personagens daqueles filmes são homens maduros e protegidos pela couraça do cinismo e o escudo dos recentimentos. Neste caso é diferente. Aqui, o nosso herói é um jovem de vinte e poucos anos, aparentemente desprovido de equipamentos emocionais para enfrentar as peripécias sinistras de um mergulho cego na sensibilidade do outro. Não quero dizer que desacredite no talento do diretor para levar a cabo a empreitada, repito que não aceitei o dasafio por questão de foro íntimo. Mas acabei curtindo uma imensa curiosidade a respeito deste jovem autor. Quem é ele? Seu romance é autobiográfico? Porque um homem tão jovem se embrenharia numa transa tão visceral? E mais: Rodrigo é a exceção, ou os jovens de hoje estão mesmo com essa disponibilidade toda para o amor? Vou começar pelo livro, que tem o título estranho de Os Seios de Deus.

Samba, Luzia

E o amanhã só chegou na sexta-feira. Veio junto com um céu de veludo azul- marinho arrematado pela lua amarela de botão. Veio com vento frio e trouxe maresia para a melhor roda de samba do Rio, no momento. É o “Samba, Luzia” que acontece toda semana no clube de nome da mesma santa, beirando a Baia de Guanabara, no final do parque do Flamengo, juntinho ao aeroporto Santos Dumont.
Quem comanda é o elegante Moacyr Luz. Escolho o adjetivo "elegante" por causa do estilo de Moacyr de se vestir e se relacionar com as pessoas a sua volta, já que sambista de primeira todos sabem que ele é. Antes da roda começar, Moacyr dá um giro pelas mesas, cumprimenta um e outro, joga charme para as moças do gargarejo, desfila na impecável bata branca com colar de contas coloridas... E faz sucesso também no social.
Social é o termo preciso para o ambiente do lugar. São casais de todas as idades, avulsos dos dois sexos, gente da zona norte e zona sul. Todo mundo de bem com a vida, bebendo cerveja de garrafa estupidamente gelada e curtindo na boa a festa na laje.
A música é de primeira. Tem muito samba de raiz, partido alto, um ou outro pagode, e o melhor dos maiores sambistas de todos os tempos; na voz altiva do cantor, na contagiante percussão e na correção altiva do violão e cavaquinho. Posso estar exagerando...? Então vai lá e tira a teima na sexta-feira que vem.