Al mare

Não sei se deu para perceber por outros textos deste blog que eu moro debruçada sobre a Baía de Guanabara. Vivo num décimo sexto andar, num ângulo tal da Avenida Rui Barbosa que o meu terraço, embora pequeno, funciona como um posto avançado sobre o mar. Daqui, vejo todos os dias a águas agitada do oceano entrar pela barra e vir calmamente se aninhar aos pés do Pão de Açúcar. Por isso, eu mesma tenho quase que como uma obrigação ir, a cada intervalo entre uma tarefa e outra, conferir o movimento no acidente geográfico mais bonito do Brasil. E como quase tudo desde esse ângulo privilegiado se transforma num acontecimento extraordinário - porque só a beleza da paisagem aqui já é um acontecimento extraordinário - , imagine você com o movimento dos barcos, os navios saindo e entrando na barra, as mudanças de luz, os efeitos climáticos e os fenômenos astronômicos.


E não é para me esquivar da inveja do leitor que vou me abster de descrever o espetáculo que a lua cheia resolveu fazer bem defronte da minha sacada neste final de semana. É principalmente porque o meu talento de escritora fica muitíssimo aquém do mínimo necessário para dar conta do recado. E também porque tenho agora uma coisa mais urgente pra contar.

Voltando ao meu posto avançado, faz tempo que venho observando o aumento da freqüência de barcos de passeio turístico às voltas pela Baía de Guanabara. Antes, havia apenas um que saía aos domingos e vinha apitar bem em frente aqui de casa, às dez da manhã em ponto. Era de amargar, para mim e todos os boêmios da vizinhança, porque madrugar num dia consagrado ao descanso deixa qualquer um de bofes virados. Mas, passado o mau humor involuntário (com devem ser todos os maus humores, suponho), eu ia para o terraço com a minha xícara de café e deslumbrada pela paisagem, começava a criar coragem para ultrapassar o dia internacional da angústia e tentar chegar, sem maiores danos, à segunda-feira.

Com o tempo, começaram a aparecer outros barcos desse tipo por aqui. Primeiro passavam apenas durante o dia, e isso nunca me comoveu de todo. Mas quando começaram os passeios noturnos, com música alta, feito festa de embalo, aí minha curiosidade se aguçou e tive uma vontade enorme de estar lá, nem que fosse como uma mosquinha, ou outro inseto qualquer que, por sua característica insignificância, pode bisbilhotar nos meios mais impróprios. E aí, eu podia estar aqui escrevendo, ou conversando ao telefone, ou distraída nas páginas de um romance qualquer que, bastava ouvir o som da festa no barco, ia correndo lá pra fora devanear com o que poderia estar acontecendo naquela que eu imaginava uma orgia de prazeres sem igual.

Pois na sexta-feira eu mesma era um dos convidados da festa num barco que sairia às dez da noite da marina da Glória e seguiria seu itinerário num passeio pela orla da Baía de Guanabara até as duas e meia da manhã. Foi a festa de final de ano de uma empresa para seus clientes e fornecedores do Rio e de São Paulo. Eu fiz parte da turma dos amigos do dono que, naturalmente, contribuiu para tornar o ambiente a bordo menos formal. Se bem que num barco, em fim de ano (e um ano desses!), não há formalidade que resista a três rodadas de uísque. E assim foi que saiu uma lua do tamanho de um bonde sobre nós e a festa rolou com dança e jantar e muito papo, e a confraternização foi geral entre paulistas e cariocas, e às quatro da manhã estávamos desembarcando na marina os cerca de cem convidados mais alegres que eu já vi. Foi uma festa careta, como vocês puderam perceber. E isso é muito legal porque eu não precisei ser mosca pra comparecer, bastou um longuinho de jérsei, uma pashimina e uma rasteirinha pra me divertir a valer. E o melhor: não teve marchinha de carnaval!
Ainda bem, porque o fim de semana é de Madonna, e eu vou ficando por aqui, pois devo estar no Maracanã as oito horas em ponto. Até lá, torço para o tempo firmar!

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