Programa Tupinambá

A posse do novo secretário do audiovisual, Silvio Da-Rin, com as respectivas promessas e empenhos por parte das autoridades presentes foi amplamente divulgada nos jornais de sábado passado que comentaram inclusive a presença maciça da classe cinematográfica brasileira na solenidade seguida de coquetel no Palácio Gustavo Capanema, sede carioca do Minc. Portanto, vou restringir esse artigo às minhas impressões e experiência pessoais naquela tarde luminosa no Rio de Janeiro.
E viva esse Rio que tem no seu patrimônio um monumento ícone da arquitetura moderna brasileira e mundial, projetado por um grupo de feras como Lúcio Costa, Oscar Niemeyer e Affonso Eduardo Reidy, entre outros, sob a supervisão de Lê Courbusier. O prédio oferece ainda um grande número de obras de arte para a fruição do visitante, a começar pelos painéis de azulejos de Portinari com motivos marinhos dispostos do lado interno e externo do térreo sobre pilotis. Isto quer dizer que um quarteirão inteiro no centro do rio se transforma em praça pública permitindo a passagem de pedestres em todas as direções, e uma notável circulação de ar que faz do logradouro um verdadeiro oásis de frescor em meio à canícula do carioca.
Por essas e outras – como a abertura das amplas portas de vidro do salão onde estávamos para um lindo jardim suspenso projetado por Roberto Burle Marx – é que um compromisso social ou profissional que a princípio parece mais um “programa de índio”, no Rio de tamoios e tupinambás pode até se transformar em boa pedida para matar uma tarde de trabalho.
E foi exatamente o que me aconteceu, pois o celular tocou e era um amigo convidando para assistir a um filme da Mostra Helena Ignez na recém inaugurada Caixa Cultural. Dei um beijo nos mais próximos e saí. Fui andando em direção à esquina da Rio Branco com Almirante Barroso, onde fica o centro cultural com mais de 6.000 m2 distribuídos entre três galerias, dois cinemas, um teatro de arena, uma livraria e um café que deixa a gente pasmada de tão bonito. E o silêncio... e o ar refrigerado... Não resisti e tirei uma fotografia:


Nesse espaço deslumbrante aí de cima, eu e meu amigo tomamos um corretíssimo expresso duplo e fomos assistir A Grande Feira, de Roberto Pires. O filme, de 1961, manifesta a influência do neorealismo italiano no Cinema Novo. Nele, o diretor conta –com longos planos seqüência em tomadas externas de registro documental - a história dos feirantes de Água dos Meninos, em Salvador, ameaçados de despejo por uma empresa imobiliária. Helena Ignez faz o papel de uma dondoca, desprezada pelo marido rico, em busca de aventuras pelos cabarés dos arredores da feira. Quando se apaixona pelo marinheiro(Geraldo Del Rey), está formado o triangulo amoroso que, junto à luta dos moradores para conservar o terreno, representa a estrutura social brasileira dividida entre os ricos e o povo marginalizado.
O filme é bom e o trabalho de Helena Ignez é estupendo. A atriz, aos dezenove anos na época, já demonstra todo o potencial do seu talento de se apropriar dos personagens, como poucas vezes se viu no cinema mundial. Os outros personagens têm nomes: Maria, Chico Diabo, Tonho, Lalá, etc. Helena Ignez é sempre Helena Ignez, porém em perfeita simbiose com a figura dramática que representa.
Com a exibição de 25 filmes em que atuou, o público pode conferir o trabalho autoral desta atriz que inaugurou um estilo de interpretação cinematográfica personalíssimo, de vanguarda mesmo. Um bom exemplo é a sua construção da loura fatal em A Mulher de Todos, de Rogério Sganzerla. Quem viu sua atuação deliciosa dançando por quase dez minutos com uma JunkBox nunca se esquece e pode rever a cena agora nesta programação da Caixa Cultural. Quem não viu, não deve perder a oportunidade na mostra que vai até o dia 20 de Janero, num dos espaços mais bonitos da cidade. Por tudo isso, pego carona na propaganda e faço agora um convite irrecusável ao querido leitor: "Vem pro centro você também!"

2 comentários:

Unknown disse...

leila ,
bom post, as duas partes.
gostei da homenagem a helena ignez.
shlomo

Leila Richers disse...

valeu, shlomo!