Rio Messiânico

O único detalhe negativo de uma viagem ao México, a meu ver – além de ter que voltar, claro –, é ter que ficar mofando no aeroporto de Guarulhos por mais de seis horas na ida e na volta. A tortura é conseqüência da ausência de vôo direto entre o Rio de Janeiro e a capital mexicana e da falta de ponte aérea entre Rio e São Paulo no aeroporto paulista, em horários mais próximos aos do vôo internacional. Se atentarmos para o fato de que desde os primórdios da aviação comercial no Brasil os vôos internacionais tinham início no Rio de Janeiro, dar-nos-emos conta de mais uma entre as inúmeras vantagens que a cidade perdeu por conta do vertiginoso esvaziamento econômico que sofre desde os anos 80.

Mas lá se vão quase trinta anos e o carioca continua o mesmo. Depois da praia, vai fazer hora na esquina ou na mesa de um bar. Ali, entre umas e outras, vocifera contra todos, malha governantes do presente e do passado, transita com fluência pelos assuntos mais quentes das esferas federal, estadual e municipal e, de repente, pára tudo para ver uma garota gostosa passar. Então, distraído, muda de assunto para futebol e volta pra casa, satisfeito, em estado de catarse quase total. E dessa forma, docemente, vai entregando de bandeja qualidade de vida para o sumidouro das mazelas que engolfam a sua cidade. Todas já tão nossas conhecidas que nem vale a pena listar.

É verdade que de vez em quando pinta um movimento de resistência, de indignação. Mas começa vago e acaba anêmico. Aconteceu como muitos “bastas” que já vimos por aqui. É que o carioca adora uma moda, mas tem por costume abandoná-la tão logo a novidade pegue, para estigmatizá-la em seguida como aquilo que “já era”. E como por essas bandas ninguém quer “pagar um mico”, fica tudo como está, até que um novo e dramático evento catalise as atenções para mais conversa de bar e, quem sabe, um novo esboço de reação.

Já ouvi dizer que se a capital federal ainda fosse no Rio, ninguém segurava um governo assolado pelo mensalão, muito menos um presidente do Congresso Nacional afundado em escândalo de corrupção. Com perdão da rima, não sei não...
Vejo o carioca de hoje ainda mais contaminado pelo vírus do messianismo do que sempre foi o conformado nordestino. Percebi isso nas conversas sobre o filme Tropa de Elite que, segundo o entendimento de um bom número de pessoas, e para a euforia geral da cidade, oferece ao público a hipótese de um salvador, um Herói Nacional, espécie de D. Sebastião tupiniquim que, se replicado em série, devolveria ao Rio os anos dourados que não voltam mais. É mais um assunto animado pra morrer afogado nos copos de um bar.

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