Copacabana engana

Copacabana engana quem acredita que vida noturna bacana no Rio só a da Lapa ou do Leblon, para ficar nos dois extremos de gosto que fazem desses pólos de lazer e gastronomia os preferidos da mídia e, por conseguinte, os mais visitados por turistas dos outros estados do Brasil.

Ipanema há muito que anda desanimada. Quando acaba o verão, depois das seis da tarde, o bairro, facilmente comparável ao paraíso durante o dia – a praia deslumbrante com as pessoas mais bonitas, alegres e charmosas ao redor – , cai numa escuridão de dar medo. Com exceção da Farme de Amoedo, a única a enfileirar bares e restaurantes, as ruas ficam desertas e alguém em seu juízo perfeito não se arriscaria a cruzar seus quarteirões com os pertences à vista.

Botafogo conta com um bom número de bares e restaurantes. Tem cinema e teatro também. Porém distantes entre si. Não dá para ir de um lugar a outro sem ouvir soar o alerta de “perigo, perigo, perigo...”, como diria o simpático robô de Perdidos no espaço.

Já Copacabana, desprezada como opção noturna nas últimas décadas, entre outras coisas por causa da onda dos “baixos”, celebrizados em outros bairros pela juventude boêmia decidida a esticar até o dia seguinte a féerie da noite anterior, está batendo um bolão em relação aos seus congêneres da Zona Sul. Vou aqui reproduzir meu programa de ontem à noite pra você avaliar se há exagero na premissa desta crônica.

Fomos ao Espaço Sesc, um prédio moderno e confortável, na rua Domingos Ferreira, assistir à peça Espia uma mulher que se mata. Para assegurar dois lugares na récita das 21:30hs chegamos uma hora antes ao local. Estacionamos o carro bem pertinho e rapidamente compramos os ingressos ao preço módico de dezesseis reais a inteira. Fomos então fazer a horinha que faltava no Cafeína da Constante Ramos, a poucos metros dali. Lá, tudo é gostoso. Eu escolhi um capucino médio, servido com financier. Meu amigo pediu um rocambole de morango com suco de laranja (não há nada como malhar duas horas por dia para liberar o apetite). Um lanche perfeito para cada qual segurar a fome até depois da sessão.

Gostamos da peça, uma releitura de Tio Vânia, de Tchekhov. O texto do argentino Daniel Veronese mantém o sentido original de crítica à decadência de uma família da aristocracia rural, na Rússia do final do século XIX, no momento em que questiona o esforço para garantir a inútil pompa intelectual de um dos seus membros, que vive na cidade às custas do trabalho árduo dos que administram a propriedade no campo.

Roberto Bomtempo, na pele de Tio Vânia, mostra um belo amadurecimento como homem e ator. O resto do elenco me pareceu apenas correto. Com exceção de Mirian Freeland que faz Sônia, a sobrinha. Papel sempre cobiçado por jovens atrizes estreantes, representa uma garota romântica, ingênua e resignada, mas que tem na força de caráter um grande apelo junto ao público. A atriz desperdiça as possibilidades do personagem com uma interpretação caricata. É um detalhe que incomoda mas não chega a comprometer a direção do também argentino Marcelo Subiotto. E o melhor foi conferir a quantas anda o teatro dos “hermanos”. Vai bem, obrigado.

Às onze da noite saímos do teatro e fomos a pé escolher na redondeza um lugar para beber, comer e conversar sobre a peça. Foi quando nos surpreendemos com a quantidade de opções num mesmo quadrilátero. Logo na primeira esquina tem a pizzaria Caprichosa. Já na Avenida Atlântica, há o bar do Hotel Pestana, aberto para o mar e com uma iluminação muito bonita. Indo mais à frente tem o tradicional Dom Camilo, com a parte fechada e mesas no calçadão. Juntinho, o Copa Café, mais escurinho e bem mais sofisticado. Ao lado, o novo Devassa com o seu público jovem habitual. Aí já estávamos na esquina com a Bolivar... Então, é só voltar em direção à Avenida Copacabana para encontrar o Belmonte que, além de um chope pra ninguém botar defeito e um caldo verde dos legítimos, tem sempre lugar pra mais dois. Como se vê, boas opções para todos os gostos, propósitos e poder aquisitivo. E ainda há os restaurantes tradicionais de Copa, como o Caravelle. Tudo em dois quarteirões com os botequins repletos de gente bebendo e conversando nas calçadas. Quando Voltamos para o carro, já passava de meia-noite, foi aí que lembramos que andando na direção contrária ao mar, há na Constante Ramos a mais autêntica crêperie da cidade. Deixamos para a próxima, que sempre haverá uma oportunidade para curtir, numa boa, a princesinha do mar.


*******************************************************************************

Nenhum comentário: